terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Hipermetropia!


Depois de adiar a ida ao oftalmologista por vários dias, hoje - enfim - por já não conseguir ler tão bem com os óculos, resolvi ir! 

De cara, a situação piorou um pouco! Dificuldade para ler me empurram para novas lentes. É o corpo enfim chegando ao patamar da idade da alma?, pensei quando peguei a receita médica. 

Pois bem, o médico - depois de várias perguntas sobre o meu estado de saúde - constatou um pequeno agravamento na já tão companheira hipermetropia. 

Vamos à cicloplegia - dilatação da pupila para os íntimos - para que ela, ao dilatar, delate o quanto estou precisando dos óculos como ponte para o fantástico universo da leitura. 

De pupilas dilatadas, sem enxergar o que escrevia, peguei o guardanapo que a enfermeira me deu para enxugar os olhos e me coloquei a escrever. Acreditam nisso? 

Pela primeira vez, depois de anos, constatei uma poesia no vocábulo hipermetropia. Que palavra linda, pensei eu. Coisa de maluco mesmo! Na primeira dobra do guardanapo escrevi hipermetropia umas seis vezes. Fiquei imaginando que outros significados aquela palavra poderia ter. 

Sei lá, poderia ser um novo avião de guerra. Poderia ser o novo celular da Apple. Poderia ser o nome da banda de rock preferida. Sonoramente perfeita. Mas, trata-se da dificuldade de enxergar objetos próximos. Olha só!

Dificuldade de enxergar o que está próximo. Pô, nós todos temos um certo grau de hipermetropia na alma. Quantas vezes não enxergamos a beleza do que está ao lado. Quantas vezes não queremos a felicidade a todo custo, sem perceber que está tudo ali. 

Quantas vezes reclamo tanto da vida sem acordar para os maravilhosos presentes que a própria vida me deu: a mulher que amo, minha filha, meus preciosos amigos e trabalhar exatamente com o que amo, as palavras. Mas, teimo em querer bilhões na conta bancária. Para que mesmo? Sei lá. Quem sabe chegar aos milhões para desejar os bilhões, para em seguida lutar pelos trilhões e por aí vai...

A hipermetropia deveria ser a doença de Sísifo condenado a um trabalho sem fim. A hipermetropia em contrastes com as nossas ambições. Por esta razão, talvez seja necessário sempre receitar poesia como lentes essenciais para enxergar um pouco melhor a vida. Lentes de poesia. 

O valor de chegar em casa, tomar uma xícara de café ao lado dos meus. De perceber na fumaça deste mesmo café a simplicidade gerando felicidade. Admirar de forma plena minhas conquistas, orgulhar-me delas. Saber no íntimo que não quero mesmo - de forma alguma - ser melhor que ninguém. Mas, luto todos os dias para ser melhor que eu mesmo. Focar nesta ambição como forma de valorizar o que de melhor já plantei neste jardim.

Por falar em jardim, esta hipermetropia desgraçada - que o oftalmologista não percebe - já me fez pisar nas melhores flores por mim já plantadas. Podem acreditar nisto!

Comecei a associar - durante a consulta - a hipermetropia agravada a estas coisas. E pasmem, a hipermetropia vai mesmo se agravando no nosso cotidiano. Os compromissos firmados do dia-a-dia nos faz perder o foco do que há de mais essencial e que se encontra tão perto, não é mesmo? Lentes de poesia, onde estão vocês? Socorro...

Pois bem, foi em uma consulta médica que decidi o nome do livro que venho trabalhando com os textos que coloco aqui e com outros inéditos. Deve ser lançado até o fim do ano. Ele se chamará HIPERMETROPIA. 

Hipermetropia
(Luis Vilar)

O que se espera atrás do monte?
Um deus? Um horizonte?
Um descanso em paz e mais nada?
O que se espera de um nome?
Uma tradução que mate a fome...
...dessa vontade de decifrar e devorar a estrada?

Das coisas que eu escrevi
Na busca de me entender
Aprendi a lidar com a hipermetropia
Lentes de poesia
Quando os olhos pediam o foco e as palavras
Lentes de filosofia para ver além dos mapas

E o que se esconde atrás do monte?
Se revelará por um nome?
Terá ele o encanto de uma graça?
Será só utopia dançando na linha do horizonte
Como uma bailarina equilibrando beleza em corda esticada?

Das coisas que escrevi
Na busca por me compreender
Foram nas cartas que não te enviei
Que mais falei de você
Com lentes de poesia
Quando o escuro era mergulho inevitável e mais nada
Lentes do dia-a-dia
Para não esquecer o peso da caminhada

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A ortografia das estrelas e o pirata insone


“Ter a mesma estrela por todas as noites ou ter todas as estrelas em uma só noite?”. A pergunta é metafórica e um tanto quanto cheia de polissemia. Quando me indaguei desta forma, olhava o céu depois de ter lido uma matéria jornalística sobre um cometa que passaria próximo a Terra. Próximo? Bem, se for levar em conta o número - descontextualizado - da reportagem o próximo é muito distante. Muito distante mesmo!

Pois bem. A estrela ou as estrelas são os sentidos. A noite: o momento da vida em que mergulhamos em nós mesmos. Um mergulho que mais parece voo em céu aberto. Lá vou eu com mais metáforas ainda. Minha eterna dificuldade de ser direto! Por vezes a gente tangencia respostas? Talvez este tangenciar seja como o cometa que passou raspando a Terra...? 

Quantas vezes o mesmo caminho - levantar da cama devido a insônia, passar pelo corredor e chegar à varanda do apartamento - me leva para outros lugares: novas reflexões, novas sensações, novas respostas, novos mundos de imaginação, novos sentidos que vão se construindo na fumaça do café. Por vezes, o resultado é esse aqui: textos, textos, textos e mais textos. Alguns publicados, outros publicáveis mais mantidos em segredos. Outros sem perspectiva de publicação mesmo!

E o que são os textos: por vezes muitas estrelas em uma só noite. Por vezes, A Estrela. O farol para quem navega por mares de bravas tempestades. O farol para quem anda por tempos severos, distante da multidão, em silêncio na busca por onde atracar. Na espera de encontrar os seus. Uma taberna com um bom vinho. Ergam os copos bravos marujos, que o bravo pirata que ousou questionar o sentido do mundo está com sua caneca cheia de café e mandou avisar: eis mais uma bela e significativa estrela. Talvez não para o mundo, talvez não para ninguém, mas para ele: o pirata! 

A estrela que estava escondida num baú cujas paredes eram de silêncio. 

Fiat lux! Estrela rara cujo o brilho enxergamos em vida. Tudo isto de dentro de um texto? Sim! Ah, bravos marujos (vocês, meus queridos e poucos leitores!) se vocês soubessem enxergar nas entrelinhas deste texto os mares bravos para a sua composição. Mas sei - bravos marujos - que nas entrelinhas vocês acabam por enxergar os seus próprios mares.  Dentre sete mares, há sempre um oitavo mar a ser descoberto, não é mesmo? Mais uma das maravilhas das estrelas que nascem, das estrelas descobertas destes baús cujas paredes são de silêncio. 

O texto é curto marujos; foi bom o papo nesta taberna imaginária. É que tenho pressa. Da varanda do meu apartamento são quase 1 hora da madrugada, estou com uma caneca de café ao lado e aviso: vou zarpar solitariamente. Não quero todas as estrelas por uma só noite, mas a estrela que dê sentido por todas as noites e aí, lá vou eu buscar...que nas entrelinhas desta viagem estejam sempre uma boa porcentagem do que quero dizer...

O mar é revolto, mas treino olhar para a contemplação! 

PS: a repetição da palavra “bravo” é proposital. É como o “X” no mapa do tesouro.

Estrelas

Todas as estrelas em uma só noite?
Todas as noites ter a mesma estrela?
Todas as dores são varáveis de um mesmo açoite?
Vários açoites para a dor de uma vida inteira...

Sete mares sem sair do quarto
Tesouro do baú da parede de silêncio
Na fumaça do café um mapa abstrato
O X que na equação é uma variável...
...marca exatamente o que anda acontecendo!

Existirá porta
Existirá porto
Sempre em frente
Sempre enfrente
Pressão e pressa
A boca selvagem; presas do tempo

Da varanda, um cometa passou raspando
Da varanda, parecia um outro planeta
A multidão lá fora adormecida
Amanhã o meu disfarce será o silêncio