terça-feira, 26 de novembro de 2013

Das leituras e seus links...

Não lembro – deve fazer muito tempo – de um período em que me dediquei tanto a estudos quanto nos meses de outubro e novembro deste ano. Saí em busca de respostas, voltei com mais dúvidas na bagagem. Entre as indagações, uma que ainda ecoa no silêncio: diante de tantos pontos de vista a serem esmiuçados, questionados, indagados, como é que tem gente com coragem o suficiente para arrotar tanta tristeza? São imaturos o suficiente para saberem de tudo! Aliás, possuem o ponto de vista sempre pronto para passar a vista em poucos pontos.

De preferência, aqueles pontos de vistas que sustentam – de uma forma pseudo-racional-argumentativa – o ódio passional que carregam e que os movem em direção sabe-se lá ao que...

O que me surpreende na atividade do estudo disciplinado – eu acredito que disciplina é liberdade! Acredito mesmo! - são os links que vão se abrindo na navegação (acho que posso usar esta palavra!) por entre páginas de livros. A leitura de Robert Gellately, por exemplo, me levou a releitura de George Orwell, que me levou a um estudo sobre os estoicos, que em seguida me levou ao mundo de Richard Dawkins, não pelo ateísmo, mas pela compreensão do homem do ponto de vista biológico.

Abre parênteses. Aliás, retirando a cruzada passional de Dawkins, há muito – muito mesmo! - para se aproveitar em seus escritos. Deus, um Delírio talvez seja o menor de seus livros. Fecha parênteses.

Por falar em links, lembro que a leitura de Dawkins me levou a honestíssimos pensadores cristãos – links e mais links! - como William Paley, Jonh Lennox e Karen Amstrong. Dois lados de uma mesma discussão, porém longe de serem apenas dois pontos de vista sobre um mesmo assunto. Uma lição de como praticar filosofia (na essência da palavra) sem as babaquices odiosas, cheias de passionalidade e causa, disfarçadas de racionalismo que acabam nos levando para a filodoxia.

Quem dera ter mais tempo para mergulhos mais profundos nestes caminhos que se abrem na viagem pelo universo das Letras. Com “L” maiúsculo mesmo. Antigamente, quando era criança o suficiente para saber de tudo, dispensei muitas leituras por puro preconceito. Hoje, tenho que correr atrás destes conhecimentos. Destas fontes. Ainda que siga discordando delas.

Foi o que aconteceu – por exemplo – com Stendhal. Conheci-o tardiamente (Mas nunca é tarde!). O mesmo se deu com o pensamento sobre o utilitarismo e a liberdade de Stuart Mill. Erros frutos de uma pueril certeza. Por sorte, a gente cresce o suficiente para descobrir que não sabe de tudo. Para entender o quanto é óbvia a sentença atribuída a Sócrates; é profunda e verdadeira: só sei que nada sei. Para entender o que de fato significa maiêutica e que, não é por acaso, se compara a um parto. Na dor e na luz. Nas fases da gestação e na beleza do nascimento.

Por esta razão, livros sempre foram sagrados para mim. Sempre os admirei profundamente. Sempre reverenciei escritores e procuro exercitar a humildade de ouvir. É preciso silêncio para detectar o que vale realmente a pena em meio a tanta gritaria. Uma tarefa que tem a ver com humildade. É preciso silêncio até o silêncio ser preciso. Lembro de uma expressão criada pelo escritor Mia Couto: “o afinador de silêncios”.

Não lembro o título do romance de Couto em que este personagem aparece. Mais uma bela história sobre a ponte entre o mundo e nós. Uma ponte formatada por experiências, leituras, reflexões, silêncios, links...e por aí vai! O que exponho e discuto aqui tem total correlação com a necessidade de abandonarmos o preconceito diante do diferente para então formarmos – de maneira humilde, mas pautados pela busca de conhecimento e da verdade – nossos conceitos.

Uma sociedade que transversaliza demais os seus valores em nome de tudo e todos, afogada na superficialidade, na gritaria e no “estardalhaço opinativo” antes de conhecer; uma sociedade da eterna espetacularização, ainda não saiu da adolescência. É o tal do imaturo que sabe de tudo. Com este não há o que discutir. Afinal, ele sabe de tudo por saber tão pouco. Quem sabe de tudo, sempre sabe muito pouco.

Há ainda entre estes “senhores das certezas” os que se arrogam intelectuais. Como diria o músico Lobão, a galera que vive batendo punheta de pau mole. É por aí...masturbação intelectual dos que falam para si ou para o seu grupo. Ou falam de forma obscurantista o suficiente para serem “inteligentes” diante de qualquer um que não tenha condições suficientes para desmascará-los. Gente muito supimpa e sempre interessada em acabar com os males da humanidade por meio da verborragia. Velho ditado: de boas intenções o inferno está cheio. Creio que o inferno – neste caso – nem precisa ser outro plano.

“Hey mãe, por mais que a gente cresça há sempre alguma coisa que a gente não consegue entender!”, já diria o músico Humberto Gessinger. Lembro de sempre cantarolar este trecho da música quando estava resolvendo os problemas de Física na escola (risos)! Lembrei disso ao ler a recente biografia de Stephen Hawking, quando ele falava sobre enxergar (encontrar!) uma teoria que abrace o todo.

Leiam meus amigos, leiam! Para saber que precisam sempre saber mais e o quanto se sabe pouco. Deixem essa história de “saber tudo” para quem de fato domina esta técnica ao não saber de nada. Ao não enxergar – e/ou construir – os links.

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Palavras que libertam são as que buscam clareza

Sempre tive uma admiração incrível por quem consegue usar as palavras com clareza, sobretudo quando partem para a construção de metáforas ou brincam com os radicais do léxico e o duplo sentido. Porém, mesmo diante das metáforas ou do sentido literal, nunca perdem o norte da clareza para com o ouvinte-leitor.

Nas redes sociais, por exemplo, o trabalho desenvolvido por Carlos Maltz (ex-engenheiro do Hawaii, escritor, músico, astrólogo e psicólogo) é algo que me chama a atenção (e muito) justamente por este motivo. O uso da palavra, quando busca a obscuridade, o proselitismo, ou a confusão mental, tem um único objetivo: dominar e fraudar um debate. É a porta aberta para a vigarice intelectual. Maltz é um excelente exemplo de honestidade intelectual no uso da rede.

Quem coloca isto de forma muito bem posta é o escritor George Orwell em seu maravilhoso 1984. Ele ressalta o “duplipensar” e a “novilingua”. Orwell mostra que o domínio mais eficaz de uma sociedade é por meio da linguagem. Por meio da linguagem é possível criar os “ditadores do bem”, bem representados pelos defensores do politicamente correto. Basta uma palavra para esconder a concepção e o objetivo dos fatos e criar uma realidade paralela.

Nesta realidade, quem desnuda os fatos é sempre alguém mal, vil, golpista, fascista, ou qualquer outra palavra – distante de qualquer argumento – produtora de uma ilha ilusória onde vivem os que sempre querem o “bem” da humanidade.

Corruptos viram altruístas “em nome da massa” num simples produzir de um dicionário que dá sustentação a uma ideologia. E quem enxerga com clareza o que se passa por trás destas palavras que servem de cortina a um sistema, logo é taxado de alienado. Simples assim. Para isto, bastam palavras. Isto por si só mostra o ambiente que se tornou as redes sociais quando nas mãos dessa gente que é sempre o “portador do sentimento mais nobre de justiça e luta pelos pobres”.

Já diria o escritor Nelson Rodrigues: “é fácil amar a humanidade; difícil é amar o próximo”. Se torna ainda mais fácil esse amor altruísta à humanidade quando apoiada em jargões e na destruição completa de qualquer adversário, como se inimigo fosse. Aliás, por meio das palavras se cria sempre um “inimigo imaginário” capaz de corromper a tudo e a todos. Desta forma, esta criatura “abnegada que sempre age em nome do bem maior” não precisa argumentar com ninguém. Afinal, todos que estão contra ele são apenas “funcionários” deste “inimigo imaginário” que quer “dominar o mundo”.

Você será sempre o Pink de um Cérebro imaginário... parodiando aqueles dois ratinhos de laboratório do desenho animado. A caricatura está pronta por meio das palavras.

Como palavras são usadas para eufemismos e deturpações: é como o Estado começar a chamar o pagador de imposto de contribuinte. Um joguete vocabular para ficarmos mais satisfeitos com o que somos obrigados a pagar. Ora, imposto é uma imposição. Imposição não é uma contribuição. Logo, não somos contribuintes. Não se trata de ser contra impostos. Claro que eles devem existir. Trata-se apenas de querer a linguagem certa para tornar os fatos claros, ao invés de obscuros.

O marketing é sensacional neste sentido. Vale lembrar o que já colocava o filósofo Confúcio – há muito tempo! – ao ressaltar: “quando as palavras perdem seu significado, as pessoas perdem a sua liberdade”. O politicamente correto dos dias atuais nada mais é do que isto. Encontrar – muitas vezes – maldade, racismo, perversidade, inimigos, onde não há nada disto. Assim, doutrinar!

Lembro de um jornalista hostilizado – recentemente! – por utilizar o termo “línguas negras” para denominar um pequeno rio de esgoto que ia até o mar. Pronto, ele virou racista para muita gente. Ora, nunca houve racismo algum na expressão.

Por outro lado, um deputado federal que defende a bandeira dos homossexuais e – em um primeiro atrito com alguém que divergia dele – chamou o debatedor de “bicha enrustida”. E aí? No caso dele, não se trata de homofobia? É a novalingua em andamento.

No dias atuais, ser um intelectual é falar confuso, é ser prolixo na vigarice intelectual para dar a impressão de que ninguém consegue rebater pensamento tão grandioso em função das palavras difíceis e das expressões que se usa. Salve Karl Popper que disse: “o cultivo de uma linguagem simples e despretensiosa é dever de todo intelectual”. Pois é. Quem é obscuro de maneira proposital não quer ser pego na própria vigarice.

Por sorte, temos sempre os atrevidos capazes de passar a rasteira “nestes senhores intelectuais de plantão” e a forma como usam a linguagem. Alan Sokal escreveu certa vez um artigo confuso, cheio de palavras difíceis, jargões e expressões incompreensíveis e mandou para uma revista científica. Sokal sabia que seu texto não dizia nada com nada. Ele foi publicado e aplaudido. Mistificasse a linguagem e esta se torna a embalagem muito mais importante que o conteúdo. Em alguns casos, sequer precisa de conteúdo.

Por isso as palavras são tão importantes. Elas servem para clarear, para argumentar sobre a realidade, para desnudar, para tornar óbvio o que é visto. Quanto mais claro alguém consegue se expressar, mais honesto intelectualmente ele está sendo. Esta deveria ser uma regra em um debate: buscar a clareza como forma de libertação, como caminho para se atingir a verdade. A verdade é sempre algo muito mais importante que os debatedores e seus egos presos à dimensão mesquinha da vaidade intelectual ou de outras vaidades e interesses.

Não importa se azul ou vermelho, se lado A ou lado B, se esquerda ou direita, se rock ou funk, enfim...é cada vez mais comum encontrarmos em simples palavras a busca pela obscuridade. Gritar, berrar, para se fazer superior. A força com que você grita não transforma o que você diz em verdade. Cito exemplos, chamar de “factóide” ao invés de argumentar fatos expostos que lhe são desagradáveis, chamar de “golpista” quem simplesmente mostra uma visão discordante, chamar roubo de “malfeito” e por aí vai o emprego de palavras e mais palavras e mais palavras que cumprem um objetivo claro naquela novalingua citada por George Orwell.

No fim, os que escrevem o dicionário da pós-modernidade – como não poderia deixar de ser – dominam sem fazer força e saem por aí arrotando superioridade com o vocabulário que criaram. Eles serão sempre politicamente corretos, serão sempre monopolizadores das virtudes. Coitado de você se tiver uma palavra que os afronte, se tiver algo que os desnude. Você saiu da cartilha, está usando o que é proibido pelos dicionários. E se a medida é a régua deles, você nunca estará certo. Será sempre o mal a ser combatido. Para todo o sempre, amém.


Vale lembrar uma regra posta para quem quer usar as palavras para obscurecer: “acuse sempre o adversário de ser aquilo que você é”.