Depois de dias de trabalho intenso, num início de
tarde de segunda-feira – quem diria! – encontro um pequeno tempo para dar
atenção ao Conversas de Quinta. O espaço
se tornou atemporal. Uma garrafa lançada ao oceano, sem hastags e “macetes”
para facilitar as buscas. Confesso: eu acabo gostando disso. Não sei quem
chegará aqui, por qual razão chegará aqui...enfim...
É legal! Parece sempre os quinze minutos pós-leitura
enquanto o sono não vem. Deitado na cama, olhando para o teto, não tem hastags,
não tem filtros...o pensamento vai...sem digitar nada na caixinha do site de
busca...links completamente aleatórios que acabam trazendo algum tipo de
reflexão!
Nesta segunda-feira, por exemplo, estava em busca de
um tema para o Conversas de Quinta. Havia o tempo; não havia o tema. Depois de
alguns minutos parado, percebo a quantidade de livros que estão espalhados pela
casa no momento em que estou de mudança de apartamento.
Lembro da frase da minha esposa, afirmando que preciso
encaixotar alguns, doar outros, enfim...já que não vai haver espaço para todos
na casa nova. Ainda não realizei o sonho de ter uma biblioteca. Quem sabe um
dia, após muitos links aleatórios...quem sabe...
Comecei a folhear alguns dos velhos “amigos”. Olho
para cada livro e me lanço o desafio de lembrar quando li. O contexto em que a
obra me foi apresentada, que emoções trouxe, que transformações causou. Separo
os livros. Primeira categoria: os mais importantes e os menos importantes.
Descubro que não dá para medir grau de importância. Putz. Como isso é difícil.
São amigos de momentos distintos. Não dá mais para
separar os primeiros anos da adolescência das leituras de Hermann Hesse, por
exemplo! Não dá mais para fingir que não li Crime e Castigo. Como encaixotar
Dom Quixote? Como mandar Albert Camus para dentro de um móvel fechado? Como não
deixar Oscar Wilde “brilhar” na estante...? Como não se emocionar com a capa da
Divina Comédia?! E por aí vai, passeando aqui por Espinoza, Kant, Stendhal,
dentre outros...
Alguns serão doados após a “arrumação final”. Espero que caiam em mãos que tenham a mesma
paixão que eu tenho pelos livros. Que encontrem almas que saibam o quanto estes
abrem novas perspectivas, apresentam um outro mundo possível...enfim...não escondo
que é uma difícil separação, mas nesta semana iniciou uma tarefa árdua:
separá-los em três categorias objetivas: os que ficarão na estante por serem os
que eu mais consulto; os que vão ser encaixotados e guardados por serem os que
menos consulto; e os que serão doados por serem edições repetidas e por outros
motivos.
Alguém pode perguntar por qual razão alguém teria
livros repetidos? Um maluco como eu compra um livro que já leu quando ele ganha
um novo tradutor, por exemplo. Um maluco como eu compra um livro que já leu
quando surge uma edição comemorativa, por exemplo. Um maluco como eu compra um
livro que já leu quando julga que a nova diagramação dada a obra é por si só
uma verdadeira obra de arte...e por aí vão os mais variados motivos que talvez
um outro apaixonado por livros entenda.
E entre uma pilha de livro e outra, nasce mais um
rabisco:
Meus amigos da estante
Dão conselhos a todo instante
Servem de espelho aos navegantes
Um GPS dos errantes...
...aos que buscam alguma salvação...
Meus amigos da estante
encontrarão outras mãos
Que sejam apaixonantes
Como foram nos meus dias de solidão
Aliviam um coração diletante
Que segue em frente enfrentando
Sejam moinhos de ventos ou gigantes
Tantos desafios que mudaram de tamanho
Se tudo é uma metáfora
Se tudo for questão de opinião
Se não houver sentido
Serão eles oásis em dias de desertificação
Daqui da poltrona viaja a imaginação
Vejo o lobo da estepe enfrentar...
...seus cem anos de solidão...
Os cegos do Saramago ensaiam...
...uma visita a montanha mágica...
...escrevem o diário de um ladrão
Daqui da poltrona parece tão real
O retrato de Wilde
Um crime com um castigo tão natural
É sempre um velho sonho...
...de uma noite de verão...