quarta-feira, 24 de outubro de 2012

A lógica do XISTCHEMA!


“Qual é a desses caras? O que é que é normal?”. Explico o contexto das duas perguntas: eu as fiz “a minha própria pessoa” quando escutava no rádio de um carro uma entrevista de um candidato a algum cargo que dizia que as acusações feitas, as baixarias, as declarações odiosas deveriam ser deixadas para trás porque havia acabado a campanha. “Passou. Era coisa de campanha. Agora, desarmado o palanque”.

Opa! Espera lá! O que é que é normal? Qual é a desses caras? Então é oficial! Está admitido que durante um certo tempo é temporada de caça, vale tudo, até dedo no olho e chute no saco. E quando se vira a página traz o buquê de flores e tapinhas nas costas. E do outro lado, eu me indago: é preciso ser mesmo muito imbecil ouvir isso e achar que tem uma certa lógica. A lógica do “xistchema” (como falava um estrategista de marketing). E os imbecis - advinha?! - somos nós! 

Mais tarde, o mesmo candidato sai com uma frase típica do pensamento: “farinha pouca, meu pirão primeiro”. Saca só: “É do jogo eleitoral acomodar interesses para formar alianças e agora dividir espaços”. E a cada dia que passa, os CARAS combinam menos com o eleitor. É um xadrez deles e ponto final. Somos apenas uma via de acesso. Um muro facilmente transponível que separa esse tipo de gente do pote de ouro. Esse tipo de gente que mente deliberadamente quando montam o aparato de guerra e depois confortavelmente se instalam no caos para lucrar com ele. 

E nós notamos isto? E nós indagamos: qual é a desses caras? Não! Também encaramos como natural. Aderimos a lógica do “xistchema”. Aderimos ao pagar para sofrer. Sim, pois nada é de graça. A conta é alta e somos nós que pagamos. A naturalidade com que ocorre facilmente o que não é natural é mesmo de espantar! O caráter de alguém não muda em função de uma eleição. Apenas, aflora o que há de pior no jogo do poder. Os podres se apontam com as mãos sujas. Depois - com as mesmas mãos sujas - dão as mãos e se abraçam. 

Uma valsa segue quando desmontados os palanques. Será que não chegou a hora de nós desarmarmos os palanques destes caras...e para sempre? Desarmar durante o processo no qual eles acham que do pescoço para baixo é canela; desarmar no período no qual eles abrem mão do que nunca tiveram: ética. Como é possível abrir mão do que nunca se teve? Sim, eis uma ironia. Não se trata de pregar uma revolução. Ou de ser progressista e blá blá blá. Pensem em dois vocábulos vazios nas mãos de idiotas que possuem graves patologias ideológicas. 

Longe disso. Trata-se apenas de parar e acordar diante daquilo que é “natural”. Tem certas frases que é preciso ser muito cara-de-pau para dizer em público. Há quem diga com uma espantosa naturalidade diante da óptica da lógica do “xistchema”. E ao fim desse texto tem sempre a galera que vai procurar classificar o que aqui está dito entre um monte de “ismos”. Será o babaquismo - então - corrente dominante? Puta merda! Por vezes, eu acho que é sim! “Tá dominado; tá tudo dominado” pode ir lá e falar o que quiser. Vai lá na rádio e fala o que quiser. O espaço é teu; o aplauso é teu e ninguém vai ler as linhas, muito menos as entrelinhas de qualquer discurso. 

No máximo, alguém vai suspirar lamentando o processo em voz quase sussurrante: “é, é assim mesmo...é política”. Não! Não é política. Política é uma atividade nobre - posso ser ingênuo afirmando isto?! Talvez - cotidiano, na qual expomos pensamentos, abrimos debates, buscamos enxergar as liberdades individuais e avaliar democracia como um processo e não um produto. Admitimos imperfeições, aderimos a autocrítica, confrontamos valores e buscamos mudanças. Isto sim é política. Com foco nas ideias, no respeito e não em pessoas. Isto é política. Qual “ismo” há nisto? Espero que a resposta (muito menos a pergunta) fundamental seja essa! 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Coragem que é de coração!


Coragem sempre me pareceu sinônimo de “agir com o coração”. Nem sei se há algo - falando de etimologia - que remeta a isto. Sei que “cor” é coração. E “agem” é do verbo agir. Então, admitamos: quando as batidas do coração falam mais alto, agem por si só, indicam por onde desbravar. Sempre acreditei nesta voz interna e isto nada tem a ver com crenças transcendentais, mas sim com o fato de sermos desconhecidos - por muitas vezes - de nós mesmos. 

As turbulências do mar - pois sempre é turbulento. Há decisões importantes a cada segundo apesar da aparente calmaria - sempre nos cobra esta coragem. Caso contrário, frustramos a nós mesmos com nossas escolhas e acabamos ficando presos dentro delas. Lamentando rumos, caminhos, escolhas, enfim...por medo de encarar a coragem ficamos traçando planos em cima do mapa do tesouro sem nunca sair do lugar. Tantos caminhos entre o “onde estamos” e o “xis”, mas sem sair do lugar.

Entra na história do: falar é fácil; fazer é que é foda! Ou do sempre esperar o momento certo para fazer? Qual é o momento certo cara pálida? De esperas por momento certo se deixa de lado uma vida inteira. E o tempo é um cruel senhor dos destinos (ou do acaso! Vai saber!). Saiba: não há tempo perdido. E é justamente por isto que a centelha queima. É fogo que se espalha e não há tempo a perder. Entre vestir a coragem e vestir o paletó de madeira está o significado da vida. Se não é transcendental, nós criamos. Mas seja um, ou o outro, estará sempre nesta lacuna. Sacou?

Não dá para tirar solo de guitarra sem corda. Não dá para aprender violão sem ter calo nos dedos. Não dá para assar pão com o forno aberto. Não dá para seguir sem coragem. Pode até fazer algo para existir, mas duvido que seja possível viver em seu sentido mais amplo. Coragem, obstinação e fé em si mesmo. Um tripé de fundamental importância. Sobretudo quando você está nos dias de caminhar contra a multidão e em silêncio. Ir contra a maré requer remar mais forte e - advinha! - ter muito mais coragem. 

Gosto do verso de uma canção do Raul Seixas: “Coragem, coragem, coragem...se o que você quer é aquilo que pensa e faz. Coragem, coragem, eu sei que você pode mais”. Simples, mas é isto. De coração e com ação, você pode mais. Lembra das margens daquele precipício? A olho nu era impossível pular. Parecia o fim do mundo. Mas com os aparelhos sofisticados da coragem, o precipício ficou para trás. Pontes que sabe-se lá depois como você conseguiu construir, mas fez! 

No final das contas já foram tantos fins de mundo que a coragem fez do coração meio que uma arca de Noé. Guarda o que é bom. Deixa mais um dilúvio passar. Depois que dobrar a esquina, as ruas que foram desertas, que meteram medo, que nos deixaram atordoado, enfim...farão sentido, daremos sentidos a elas com o sabor das novas conquistas. Aliás, se eu não tivesse passado por onde passei fatalmente aqui não estaria. É pouco e simples, mas é de coração. 

É isso! 

Um "pê" "ésse":

Ah, e um amigo me disse assim: “Cara, eu gosto do Conversas de Quintas, mas tipo os textos são muito longos para a internet. Sabe como é: a galera tem pouco tempo, muito link, textos curtos te ajudariam a alcançar mais leitores”. 

Caramba, eu digo agora: coragem de não me moldar ao que o tempo pede, mas seguir com o que eu acredito. Parece loucura, utopia ou quixotesco, mas sempre acreditei que a minha maior prova de respeito ao meu leitor é não pensar nele enquanto escrevo. Se é que alguém me entende! É por isso que respeito demasiadamente quem aqui vem, ou quem vem no outro blog “profissional”. 

É o seguinte: eu estou oferecendo um xícara de café e um bom papo. Respeito se alguém quer água, frase feita e silêncio. Mas não é isso que emociona as cordas do meu violão. Logo, coragem para desligar o rádio quando começar a música da moda. :) Vamos para uma outra frequência... 


terça-feira, 16 de outubro de 2012

Mundo vasto mundo...vasto mudo!


Mundo vasto mundo, mais fácil fazer rima do que fazer sentido ou achar solução! Eis que as madrugadas roubam o sentido da “lógica do sistema” e o mundo vasto mundo se encontra logo ali na esquina com uma caixa de lápis de cor para pintarmos novos valores, novas verdades, novas lógicas, novas poesias, novas artes, mas jamais - JAMAIS! - sentido absoluto para momentos em que buscamos um “algo” mais transcendental. 

Talvez, por entre versos, o sentido se faça.. A sina do poeta. Como a magia de um sol nascendo iluminando a sala; como a magia de um olhar que - em instantes - clareia tudo aquilo que o nosso coração teima em manter escondido dentro de si mesmo. Talvez por puro amor. Por celebrar a beleza de se estar vivo e só! 

Nas madrugadas, quando perco de vista a tal “lógica do sistema”, o pragmatismo das decisões; afasto o mundo prático, restrito, pequeno, dos sentidos tangenciáveis em funções das decisões sobre os pilares fundamentados dos valores...e dou de cara com um universo suscetível uma série de interrogações metafísicas, mas que não possuem qualquer pretensão de encontrar respostas transcendais. Talvez por desconfiar que tais respostas não existem.

O mergulho com hora marcada no mar a ser desbravado dentro do oceano denominado insônia. Neste instante, escrevo numa pequena folha de papel ao lado: que causa ainda emociona? Como é possível adotar um pragmatismo de forma tal que nos venha impedir de sonhar? Falo de “sonhar” em um sentido bem amplo. Não estou falando das metas factíveis com as quais sonhamos: o carro novo, o emprego novo, e por aí vai...falo sonhar de forma mais ampla dentro de um mundo vasto mundo onde o coração busca mais que rimas, talvez até mais que soluções. Sonhos metafísicos. 

Não se espantem, meus caros, apesar de no final desta fazer existir uma exclamação! O lirismo pode ser áspero, irônico e estar no muro de concreto cuja única função é esconder um jardim. O lirismo pode estar na insônia, pode estar na nostalgia, nas causas perdidas que teimam em nos encontrar (ou seria reencontrar). Não abandonamos versos, os trancafiamos em silêncio, varremos para baixo do tapete. Uma hora a coisa salta aos olhos. Fica visível no escuro da sala, aponta para todos os questionamentos que concentram o infinito na fumaça da xícara do café, na ponta do cigarro que se espreme contra o filtro até deixar de brilhar (serve até de metáfora para a vida humana).

Mas, nossa chama brilha sem filtros; entra na veia. Luz que se espalha. Centelha que ilumina. Coração que dispara. Respiração que foge ao controle no meio de uma madrugada. O mundo vasto mundo está te encarando do espelho. Vontade de chorar, gritar, silenciar, seguir, parar...enfim...fome de sentido diante de uma interrogação posta: a existência. Interrogação profunda que para alguns pode levar o epíteto de “crise existencial”. Aos pragmáticos, o sentido literal que pode sequer tangenciar o que falo agora. Aos insones, a certeza de que é bem mais difícil a conquista do espelho do que a corrida pela conquista do espaço!

Do eu do “dia-a-dia” para o eu insone, uma ponte. Apresento a ponte por onde passam as palavras que rompem o silêncio e que me trazem até aqui. Qual a bagagem destas palavras. Bem, uma mala onde cabe tudo e onde cabe o nada. Uma existência que toma a forma moldada por valores que me antecederam. Alguns contra os quais luto, outros que aceito. Mas serão eles pilares, acertos, verdades...vai saber! Na insônia, o mar é vasto...

Se por um lado a insônia pode ser vista como um mar vasto; por outro lado, é também uma ilha de onde contemplo o mundo em silêncio, mas mesmo assim em movimento. Sartre me dá razão, a insônia me dá a sensibilidade. Razão & Sensibilidade. Já tem um livro com esse nome né?! Putz, cheguei atrasado...

Mas, toda vez - em meio a estes turbilhões provenientes da insônia - sempre chego atrasado a algum sentido, como se fosse livre apenas para escolher minha própria prisão de crenças. É o que? Faz sentido? ido...ido...ido...ido...ido...? É, caros insones, o eco de nossas madrugadas. Mundo vasto mundo, é o que tens a responder. O eco rima, mas não é solução! 

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Meus horizontes dentro do horizonte


Dos cantos da casa onde moro, talvez o que eu mais goste seja a varanda. Costumo dizer - em casa mesmo! - que lá fiz meu escritório. Uma pequena mesa e uma cadeira. Lá, é possível encarar a linha do horizonte. É bem verdade que esta vista diminuiu com o tempo. Mas, por entre prédios e outros pilares da selva de pedra (nada contra ela; só para usar a metáfora) ainda consigo tirar a cara do computador e contemplar o horizonte por meio de brechas. 
Observar o mesmo horizonte sempre me mostrou novos horizontes. É assim, por exemplo, quando - em alguns fins de tarde - ando pela orla. Sempre com o foco na linha que parece colar o céu com o mar. Qual a sensação? Bem, o horizonte é utopia, mas postas metas perfeccionistas em cima dele é possível definir um norte para chegar o mais perto possível de tais metas. Sempre fui um cara disciplinado neste sentido. Sempre fui de me impor tarefas, planos, metas e objetivos. 

Conquistado um é respirar fundo e partir para outro. Neste sentido, acumulei vitórias, derrotas e - metaforicamente! - já perdi dentes e levantei troféus. Tudo isto sem perder horizontes de vista. Sem deixar de saborear o vinho, mas sempre com a ciência de que se deve brindar às uvas. Buscar a meta, mas sem perder a beleza das pequenas conquistas paralelas do caminho. Até as conquistas não previstas. 

Os imprevistos são maravilhosos. Podem alterar a percepção do horizonte. Marinheiro que conhece os sete mares e em uma onda inesperada enxerga nestes mesmos mares um oitavo mar. Dá para entender? Acho que sim! Dos horizontes já tirei poemas. Olhando para os horizontes já fiquei rabiscando em guardanapos (lembra desse texto? Tá lá para baixo neste blog). Dos horizontes já tirei até planos para a profissão. Alguns deram certo; outros não. 

Foi em uma tarde, andando na orla - eu, o Ipod, minhas circunstâncias e o horizonte na cara - que decidi fazer o Blog do Vilar Ao Vivo. Uma hora depois liguei para o jornalista Carlos Melo informando do plano. Ele deu o “ok” na hora. Depois liguei para uma jornalista Laíse Moreira (GRANDE AMIGA) e pedi ajuda no projeto. Ela não só topou como enriqueceu a ideia e transformou no que o Blog do Vilar Ao Vivo é hoje: um talk-show (escreve assim? Preguiça de olhar no Google. Prefiro arriscar a escrita olhando a linha do horizonte...hehehehe). 

Foi em uma outra tarde, da varanda de casa, olhando o horizonte, eu, o Ipod, minhas circunstâncias, uma xícara de café e uma brecha apontando para o horizonte, que decidi pedir demissão da Tribuna Independente e investir em um projeto ainda embrionário que está nascendo (mas não estou autorizado a falar) e que pode dar certo. Espero que sim. No fim das contas, sabe aquela história de abandonar a zona de conforto? Pois é, acho que o olhar ao horizonte é um primo-irmão-gêmeo dela. 

As pessoas que me acompanham devem ficar malucas com minha “lógica ilógica” nas decisões, mas me guiaram até aqui. Fizeram-me conhecer o melhor e o pior de mim. Em alguns momentos foram ventos, em outros foram âncoras. E no final, mesmo as derrotas se transformaram em troféus na parede da memória. Como as cicatrizes. Com o tempo aprendi a encarar minhas cicatrizes como customização. Saca? É inevitável esta alquimia. Com o tempo, é sim inevitável. Pode crer! 

E por fim. Foi em uma outra tarde que - parado no engarrafamento - que virei para o lado, olhei o horizonte. Era uma quinta-feira e pensei no Conversas de Quinta. O blog perdeu a temporalidade. Não consegui manter o ritmo. Mas, foi um acerto e tanto do ponto de vista do confessionário. Para vocês entenderem qual é o sentimento eu posso afirmar que o Conversas de Quinta trouxe o horizonte para dentro do computador. 

Por vezes, um texto como este aponta para novos horizontes e lá vou eu construir pontes entre o local que estou agora e o horizonte que vejo. Óbvio que não o alcanço, mas o que se vai fazendo no caminho é impressionante. Poesia pura. Perdas e danos, danos e perdas...enfim, versos impressionantes em forma de prosa, em qualquer forma, em forma de silêncios que talvez nunca sejam publicados. 

Sabe o que faço agora? Escrevo da varanda. Bem! Por hoje é só. Agora, cara para o horizonte e daqui a pouco voltar a trabalho. Valeu pessoal pela companhia de sempre. 

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Das paredes paralelas que se juntam...



Na infância, quando assistia desenhos e filmes de herói, era comum - alterando-se os contextos - a repetição de uma cena que me chama atenção: o herói em questão caia em um buraco (fosso) e em instantes as paredes começavam a se fechar. Ele estendia os braços colocava uma palma da mão em cada parede e empurrava em sentido contrário. Vi demais essa cena na infância, em diversos episódios de desenhos animados diferentes. A cena sempre me incomodou. Desligava a televisão e voltava depois, quando tudo havia sido resolvido. 

Mais tarde - já na adolescência - fui apresentado a obra de Albert Camus. Ao contrário da maioria, que começa pelo Estrangeiro, meu primeiro livro dele foi o Mito de Síssifo. A história do cara que é condenado a levar uma pedra ao topo da montanha. De lá, soltar a pedra. Depois ir até o “piso”, pegar novamente a pedra e reiniciar o caminho ao cume. O livro me lembrou dos episódios e das cenas que me incomodavam, descritas no primeiro parágrafo. 

Pois bem, eis que comecei a perceber - no auge da paixão pelo existencialismo - que a estada consciente em um mundo era uma linha tênue sempre imprensada por duas paredes invisíveis: “por que aqui estamos?” e “quando se fizer o silêncio total e inevitável do ‘deixar’ de ser” para onde iremos?”. Neste “imprensado”, estendemos cada palma de nossas mãos para não sermos sufocados por estas paredes. Eis que aí, concordava - já na época - com a a clássica tirada: “a existência precede a essência”. 

Passava a ser essencial a escolha de um sentido como uma prisão inevitável, para que a ausência de sentido e a completa liberdade não nos torturasse diante do fato da nossa racionalidade - permeada pelo pensamento materialista - não encontrar razão para “estar no mundo” e o em instantes “não estar no mundo”. Lembro-me de José Saramago ao falar da morte. Dizia ele não ter medo, mas um certo lamento diante do não estar mais. É um sentimento que compartilho. Não temo a morte. Eu tenho pena de morrer diante do maravilhoso milagre da existência, mesmo com todas as suas dores: as suportáveis e as aparentemente insuportáveis, que com o tempo suportamos. Afinal, insuportável mesmo só a morte, mas para que preocupar-se com ela? 

Daí, uma questão filosófica resumir tudo muito bem, como diz Camus: “só há verdadeiramente um problema filosófico: julgar se a vida vale a pena ser vivida ou não é responder a questão fundamental da filosofia”. Eu acredito que, mesmo diante das paredes que nos imprensam e dos fossos que caímos, que cairemos, ou que - por acaso - dos quais neste momento estamos tentando sair, vale sim a pena. Há na vida - vale a pena lembrar o escritor alemão Herman Hesse - um “teatro mágico só para iniciados” em novas esquinas por aí. 

É preciso exorcizar o mundo de seus demônios - como diria Carl Sagan - para conseguirmos contemplar de forma mais justa a beleza de aqui estarmos. Isto é independente de deuses, fadas, duendes, e outras forças que sirvam barra de metal para manter aquelas paredes separadas. O imprensar dessas paredes metafóricas nos leva aos questionamentos que são essenciais para a libertação. Se é que vocês me entendem, meus caros leitores. 

Já encontrei amigos que ao final destas indagações reforçaram ainda mais suas teses iniciais sobre aquilo que acreditam. Encontrei as metamorfoses ambulantes e por aí vai. O importante é que não sejamos Síssifos. E olhe que existem Síssifos por aí que levam a mais pesada das pedras do cotidiano anestesicamente confortáveis. A essência de seus valores estão postas em pedaços de papéis valiosos. E assim, dia e noite se sobe e desce pedra para acumular vil metal. Vão no avião confortavelmente na melhor poltrona, do lado da janela, mas sem tempo de olhar a paisagem. Estranho paradoxo. Estranho paradoxo de estar o tempo todo na crista da onda, mas sem tempo e inteligência o suficiente para pensar sobre a imensidão do mar. (O meu medo de usar muitas metáforas é ser incompreensível, mas nunca soube escrever de outro jeito!).

Pois bem, isto sem contar com o mundo que nos oferece mais ídolos que verdades. Mais adjetivos e frases feitas que argumentos, mais atalhos que caminhos produtivos...há quem ache isso ótimo. Eu fujo disso. Vai que a existência é só uma. Por via das dúvidas, eu ainda quero o melhor dela. E alguns dos melhores momentos estão nos segundos, minutos, horas após a superação da pior das dificuldades, quando respiramos o ar puro do alto da montanha da qual soltamos a pedra para nunca mais ir buscá-la lá embaixo.